terça-feira, 15 de outubro de 2019

Segundas

As segundas, eu me sinto ninguém.
O resto de domingo dorme em meus olhos e não consigo acordar.
Automático.
Acordar. Roupa. Trem. Sol. Trabalho.Noite.

Eu não sinto as horas passar. Mais uma na multidão.
Mais algumas letras, que ninguém lerá.

A espera pelo novo ciclo, e a felicidade de ser alguém.

Quando irei me pertencer novamente?
E quando foi que me perdi, me vendi?

Se senti felicidade? Talvez sim.
O caminho está chegando ao fim, e é a parte que dói mais.
Que demora mais, que aperta, amassa, esgarça, entorta, sufoca.
Não, eu ainda não estou morta.

E não morrerei.
Exagero, concordo.

Eu já andei por outros desertos, e eu sei que vou encontrar o caminho de volta pra casa.
Como faço todos os dias.

sábado, 29 de dezembro de 2018

Palco

Andando pela rua, lá pelas nove da noite.
Andando pela rua com meia luz, me senti num palco.
Ainda andando, fiz um monologo.
Curto, e ainda sim longo.
Todo a cena se passa em mim.
Durante a cena eu olho para cima, como se estive contemplando o céu.
Olho para a platéia, não me intimidei (pois as vezes tenho medo de sair da coxia).
Segui e não era interpretação, era a minha vida.
Eu narrei a nossa casa, nossa árvore crescendo, nossa felicidade crescendo. As chuvas pelo caminho.
Tudo.
Uma vida inteira traduzida em uma palavra: amor.

As cortinas se fecharam bem atrás dos meus olhos.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Estudo sobre o amor I

Amor nao é sobre servidão. Sinceramente nao sei o que é o amor, mas sei o que não é. Amor não é desmedido, estou aprendendo a hora de ir embora, e a de chegar. Sim, ainda me perco no meu tempo. Amor não é entregar-se sem racionalizar. Não se enganem, o amor é racional. E ainda assim, não conseguimos defini-lo do jeito que é. A definição foi sublimada, logo racionalizada. O amor deveria ser belo. Aquilo que não tem explicação, apenas a experiência empírica de vê-lo. Ainda quando digo essas palavras, estou colocando o amor no lugar sublime. O amor não te deixa fraca. Nem em dúvidas. Nem triste. E por que nos sentimos assim? Libertaram nossos sentimentos. São cavalos enormes, selvagens, correndo sem rumo. Que ainda assim é um rumo. Dosar. Controlar. Rédias. Limites. Enfim...

Eu, neste momento, estou racionalizando nosso amor. Tentando encontrar o objetivo, os porquês. E encontro o belo. A não explicação. Ficamos por sabermos que podemos ir e ficar. Assim. Talvez o amor seja uma raíz da liberdade.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

História de pescadora.

Teu coração me lembra o oceano.
Cheio de correntes marítimas. Mar.
Fui navegar.
As correntes marítimas não são apenas uma grande massa de água que te leva a algum lugar, é feita de vento, de histórias.
Fui navegar.
Os ventos me trouxeram à aventura mais calma que pude ter. Pude ver o silêncio que mora dentro do mar, que mora dentro de mim. Vi terras onde ninguém parecia ter avistado, intacta.
Meus olhos contemplaram o que dizem ser história de pescadora: em muitas noites em que eu achava que estava só, ou que olhava para as estrelas tentando me encontrar, senti um par de olhos sobre mim. Olhei para minha jangada, e nada.

Olhei para a água.
Ela estava lá.
Minha vida desapareceu diante daqueles olhos.

Uma música tocou no meu peito: Quem é que já viu a rainha do mar?

Cobertor

Debrucei os braços na parede, permitindo-me contemplar a água quente que alisa minhas costas. Era a única forma de distrair o peso que havia em meu corpo. Lembrei do dia que foi mais do que normal, estudos, trabalho. A única coisa que fez meu coração sobreviver àquele dia inteiro foi pensar no encontro com o corpo dela. Pensou sobre a boca que ansiava, sublinhando-a. Desejei ser aquela sroupa. Desejei ela. Por fim, quando já era de noite, o mundo externou meu interior: uma ventania repentina, que foi capaz de derrubar a energia dos postes, fazer os carros dançarem sobre o caótico trânsito e muitos papéis serpentinarem pelo ar, como numa grande festa de carnaval. Ao ver aquela silhueta que nunca mais vou esquecer, estremeci por dentro. Toda aquela orquestra que a ventania ocasionou parou, somente para eu contemplá-la.

Em casa, a euforia logo se transformou em amor. Estava  muito agitada, excitada, inquieta, desassossegada. Por motivos óbvios, o amor da minha vida estava comigo, finalmente.
Por um detalhe, algo saiu de errado. Talvez uma palavra ou um cuidado a mais. Eu sempre falo demais. Aqueles belos par de olhos adormeceram. Com um grande buraco em mim, senti que minha saudade não passou. Que o tempo foi curto. Que a ventania continuava. Nesse preciso momento, observava o cobertor desenhando as os traços, as linhas, as infinidades dela.

Desejou muito ser aquele cobertor.

domingo, 13 de novembro de 2016

O Deserto

Hoje eu tenho medo do mar.
Saber que sua imensidão é finita não me alivia.
O céu é infinito, e por mais que saibamos sobre ele, podemos esperar qualquer coisa.
O mar não. Deveríamos saber o que vai acontecer, o que vamos encontrar. Mas nunca sabemos.
A venustidade que o imenso verde azulado mar pode nos causar é inebriante.
É eterno. Como se fosse amor. Acho que é amor.
Ninguém esquece do som do mar.
Ou como as curvas desenhadas a cada vento.
E dos encontros com o sol.
A dança com a lua.
E da fúria quando se junta com a chuva.
As vezes eu esqueço a força que o mar tem.
Eu entrei em tuas águas, e não queria mais estar em terra firma.
Na harmina do seu balanço me entreguei.
As vezes eu me afogava, mas não me importava.
E quem está ao mar, a alto mar não escapa de estar a deriva.
A correnteza te leva, e você não sabe mais do seu rumo.
Olhei em volta e só a havia a serenidade. A calmaria. Nenhum som.
Nem vento. Nem chuva.
Um deserto líquido.

Segredo

Vazio.

Tinha certeza que tinha algo por aqui.

Se você me conhece minimamente, sabe que eu não sou muito de falar.
Eu acho que não tenho muito a dizer.
Na verdade, acredito na ação. As ditas, pela boca, se perdem no espaço tempo.

Quando concretizamos as palavras, podemos de alguma forma torna-las possíveis.
Então eu observo.

Eu olho tudo.

Sei mais sobre os detalhes.
Fico imaginando se meus olhos pudessem falar, o que diriam?

Fico aliviada por meus olhos apenas enxergar.
Pois se dissessem, todos iriam saber dos meus segredos.

Os segredos do mundo.